terça-feira, 26 de abril de 2011

Candyman. Candyman. Candyman. Candyman. Candyman.








Dificilmente alguém com mais de 20 anos não ouviu esta história em algum lugar: "Fique de frente para um espelho. Contemple-o fixamente. Pronuncie: 'Candyman. Candyman. Candyman. Candyman. Candyman.' ".
Este era o modus operandi para se evocar a figura de Candyman, um negro de aspecto sinistro portando um  gancho no lugar de uma das mãos, e que, como prêmio, com certeza ia arrancar seus intestinos logo após a bem sucedida evocação.

Clássico filme de terror, O Mistério de Candyman, de 1992 conta a história de uma antropóloga chamada Helen Lyle, decidida a investigar uma lenda urbana a todo custo. Esta lenda trata-se de Candyman, um fantasma de um negro escravo que teria sido brutalmente assassinado um século antes por ter se envolvido amorosamente com filha de um senhorio branco.

Esta pobre criatura, que no segundo filme da série sabemos que se chamava Daniel Robitaille, era um artista. Ao pintar um quadro da filha do senhorio, ambos se apaixonaram. Descoberto o romance(e de bônus que ela engravidara dele), foram aplicadas as punições cabíveis a ele segundo os critérios legais da época.

Imobilizado, espancado. Uma de suas mãos fora cortada lentamente com um serrote enferrujado. Em seguida  teve seu corpo todo besuntado de mel de abelhas.Quando estas chegaram, deixaram seu corpo irreconhecível e deformado de ferroadas.




Como no momento de sua morte sua alma teria ficado presa em um espelho, daí o modo de evocá-lo. 

Originalmente a história de Candyman é baseada no conto "The Forbbiden"(O Proibido), do escritor inglês Clive Barker. A quem possa interessar, este conto se encontra em uma coletânea do autor chamada "Livros de Sangue", no volume 5.

Para quem não sabe quem é Clive Barker, basta lembrar de outra série cinematográfica mais que sinistra, fruto também dele: "Hellraiser- Renascido do Inferno".


Acima temos o todo poderoso Pinhead e os Cenobites de Hellraiser. Lindos, não?

Mas o que é mais interessante em Candyman é que ele talvez tenha sido o primeiro filme a estrear o conceito de lenda urbana no cinema.
Quem já não ouviu falar da similar Bloody Mary, ou mesmo da nossa nacional Loira do Banheiro?

Frutos talvez de isolados acontecimentos reais, algumas histórias de nossas cidades acabam por tomar uma proporção exagerada e tomando contornos de um folclore particular aos centros urbanos, ao serem passadas de boca a ouvido, de geração à geração, com cada vez mais acréscimos e exageros. Até chegar ao ponto de ser objeto de uma crença coletiva, despertando ora temor, ora respeito. A existência destes ícones passa a não mais ser questionada.

Mas uma vez que sabemos que é só uma lenda, será sempre uma lenda e nada mais que uma lenda, certo?
Há um grupo de pessoas que sustenta que não é bem assim.

Existem teorias ocultistas contemporâneas que supervalorizam o poder das crenças coletivas. Unindo conhecimentos de parapsicologia, e até mesmo física quântica, estas vertentes tentam explicar e defender que, o fruto de uma crença coletiva pode sim, adquirir status ontológico e interferir na nossa realidade.

É o caso dos adeptos da Magia do Caos, que defendem que qualquer egrégora pode ser evocada, independente de se tratarem de deuses ou não.

Acima sigilo da caosfera e da magia octarina.


Para quem não está acostumado com o termo, egrégora é uma convenção mental. Pode ser particular ou coletiva. Quando é coletiva, é uma crença comum de um grupo ou uma sociedade em um ícone, um arquétipo, onde todos convencionam as mesmas características para aquele arquétipo.
Assim são construídas as características dos deuses de uma religião, por exemplo.

O que os magistas do caos fizeram foi estender essa concepção afirmando que também são egrégoras válidas  ideias coletivas como Papai Noel, por exemplo, ou um herói de uma revista popular mundialmente conhecido como o Super Homem. E mais. Assim como magistas de todos os tempos tentam evocar entidades e invocar deuses, estes personagens também podem ser evocados e invocados, com a preparação ritual apropriada.

Já pensou trazer o Batman, por exemplo, para o círculo mágico de sua sala?





A questão é que esta possibilidade, se existente, também se aplicaria a lendas urbanas como o caso de Candyman. Independente se o fato original aconteceu(no caso de Candyman parece ser pura ficção), a crença e a energia mental dispendida a esta figura quase mítica pode ser um foco para manifestações parapsíquicas.

Pessoas podem sonhar com esta figura, podem ter alucinações com um negro com um gancho. Fenômenos de aparições, objetos que se movem, e até mesmo presenças podem ser sentidas por pessoas mais sensíveis, envolvendo traços da referida lenda urbana. E isto é o mínimo.

Duvidam da capacidade humana de criar efeitos na realidade? O que é o efeito placebo então? Há pessoas que pelo poder de sua crença se curam até mesmo de doenças como câncer. Isto pode ser um ato de fé, de uma pessoa extremamente religiosa, ou um auto engano, quando ela pensa que tomou uma remédio poderosíssimo, mas na verdade deram para ela pílula de farinha(placebo).
Não importa. Em ambos os casos os médicos admitem que a crença da pessoa interferiu positivamente em seu estado fisiológico.
Agora imaginem isto em uma escala coletiva... milhares... milhões acreditando na mesma história, com força de verdade e com um intenso conteúdo emocional...
Bom... deixo às especulações.

Voltando ao filme Candyman 2, mais uma vez Nova Orleans merece um post à parte.
A história se passa durante um dos mais famosos carnavais do mundo: Mardi Gras(terça feira gorda) de Nova Orleans.
As cenas são caracterizadas de um conteúdo pagão intenso, com os indivíduos vagantes e virulentos andando com máscaras zoomórficas por todas às ruas como uma legião de demônios e fantasmas. Muito mais próximas ao Punchinello e à Saturnália do que qualquer outro carnaval.




Enquanto uma bizarra melodia ao piano toca ao fundo, um narrador embriagado de luxúria dá o tom do apocalipse de toda hipocrisia e falsa moral eclipsadas pelo evento:

"Oh, sim. Oh, sim. Oh, sim. Agora estão a me fazer orgulhoso, New Orleans. Nós estamos a comer carne crua. E conto-te o porquê. E não vou para casa até isto acabar. Vou estar em cima o tempo todo. Começa amanhã mes amis, e eu, eu quero algo saboroso."


"O mundo está a mudar, irmãos e irmãs, apressem-se em direção ao amanhã. E eu não sou o homem que costumava ser. Tenho cascos nos meus sapatos e chifres em minha cabeça. Eu quero a vida numa bandeja média rara. E tu podes ficar com os talheres de prata, porque hoje vou comer com as minhas mãos."


"Faltam 29 minutos, New Orleans. 29 minutos até o julgamento. Por isso, embebedem-se, engordem e fodam-se. Sim, tens razão. Eu o digo. Todos vocês podem confiar no Kingfish. Os céus acabaram de nos abrir os bancos do Mississippi e nós estamos prestes a estourar. Eu acho que eles não vão segurar mais. Estão tão cheios quanto a barriga do Kingfish. Sim, Mardi Gras."


Simplesmente fantástico e bizarro. Gera um nível de angústia que só os clássicos do terror podem proporcionar.

A queridinha dos filmes de terror e magia(Nova Orleans) é famosa por seu clima bucólico e misterioso. Considerada um ponto de referência da magia negra na América do Norte, é taxada como o "point" dos praticantes de voodoo. 
Nos romances de Anne Rice foi ambientação para as peripécias da dupla vampira Louis e Lestat, onde é muito bem ambientado. Tem outro principal representante no cinema que é o filme "A Chave Mestra", onde um casal de praticantes de magia negra usurpava o corpo de jovens casais para continuar prolongando sua vida terrena indefinidamente.



Lestat, Louis e família à caça nas ruas de New Orleans em "Entrevista com o Vampiro", de Anne Rice


Protagonista no aperto tentando se proteger de magos negros de New Orleans em "A Chave Mestra"






O interessante em "A Chave Mestra" é que o argumento do filme pode ser resumido em: Acredite nisto e isto será real.

Para mim, o espetáculo à parte em Candyman é a trilha sonora. Tanto no primeiro como no segundo filme, os arranjos de piano levam o expectador para dentro da angústia existencial que precede a morte dos personagens. É uma sensação de que nossa vez está agendada e não há nada que mude isto. Escutem e sintam: é como se alguém houvesse acabado de morrer.









Abraços fúnebres a quem passar por aqui...







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